Angela Natel: "Hoy estoy satisfecha con mi incomprensión de Dios, ya no intento definirlo"

Meu nome é Angela e tenho 41 anos. Sou teóloga, linguista, professora e pesquisadora, autista e assexual.

Durante muitos anos, boa parte de minha vida, vivi sob o estigma do estranhamento. Por gostar de estudar, desde pequena desviei a atenção das pessoas para meu desempenho escolar, tirando a atenção das questões que envolviam sexualidade e interação social.

20201118_135050.jpg

Hoje entendo que a maior parte de meu comportamento se resumia a repetir padrões considerados ‘normais’, tanto no que diz respeito à socialização quanto à sexualidade. Assim, entrei na brincadeira e aos 12 anos dei um beijo só de lábios pela primeira vez, conquistando a aceitação na escola. Ao mesmo tempo, no ambiente religioso fui sendo cada vez mais aclamada como exemplo, uma vez que não me envolvia de forma romântica ou sexual com ninguém. Isso não significa que eu não me considerasse apaixonada, ou romântica, e sempre busquei companheirismo e amizades profundas com as pessoas, independentemente de sua identidade sexual.

Dessa maneira, aos 16 anos eu já era líder de grupo de jovens e aproveitada para discursar sobre o compromisso dos jovens se guardarem sexualmente até o casamento. Assim, fui instrumento de regras fundamentalistas dentro da instituição religiosa, repetindo padrões de comportamento considerados aceitáveis dentro desses ambientes a fim de me encaixar socialmente pois, de fato, eu não sabia como fazê-lo.

No que diz respeito ao meu relacionamento com Deus, sempre foi muito marcado por crises existenciais, orações mecanicistas e novamente por repetições de padrão. O autismo – cujo diagnóstico só recebi recentemente – se mostrava no fato de eu ter extrema dificuldade em orar falando, e quando o fazia em público seguia fórmulas que eu já havia estudado e percebido que funcionavam. Eu orava por escrito, repetindo e atualizando textos bíblicos às minhas vivências. Quanto à sexualidade, era um assunto inexistente em meu relacionamento com Deus, e isso afetava a forma como eu enxergava Deus – um homem assexual. Assim, a sexualidade dificilmente aparecia em minha hermenêutica e quando surgia, para fins de estudo em comunidade, era repetição de falas de quem era considerado padrão sexual para o ambiente da Igreja.

Fiz seminário teológico, o curso de magistério (formação de professores) e cursei a faculdade de Letras Português-Inglês. Aos 24 anos fui para Moçambique como missionária. Ao todo, entre idas e vindas, morei 4 anos em Moçambique, onde me encontrei em situação de extrema vulnerabilidade. O foco de meu ensino, que hoje considero como colonizador e opressor, era contra ‘heresias’ (falsos ensinos) e sincretismo religioso. Nesse contexto, em meio à carência emocional, aos 28 anos de idade, conheci um nigeriano que morava no país. Confundindo amor romântico com sexualidade, casei-me, sem ter noção alguma do que envolvia um casamento. Todas as orientações que recebi a esse respeito foram por parte de pastores da Igreja, que em momento algum me esclareceram de fato como tudo devia funcionar.

Em minha lua-de-mel lembro de ter me assustado e dito vários ‘nãos’, mas não fui ouvida e em menos de 3 minutos eu estava deitada com muita dor ao lado de alguém dormindo como se nada tivesse acontecido. Chorei muito, mas na época eu entendia – por causa do ensino da igreja - que era minha obrigação satisfazer meu marido, e a cada relação, ainda que ele mais tarde começasse a demonstrar interesse em me satisfazer, eu me sentia culpada, como se estivesse apenas encenando um teatro para cumprir uma função social. Além de tudo isso, eu sentia que não podia ser verdade que o sexo, algo tão enfatizado na sociedade, se resumisse a algo que me causava dor, constrangimento, culpa, nojo e desprezo por mim mesma e pelo outro.

Durante o ano em que estive casada, sofri todo tipo de violência: física, psicológica, patrimonial, emocional. Ao comunicar isso ao meu pastor na época, ele questionou meu marido, que negou tudo, e o pastor me teve por mentirosa, situação que se manteve. Doente física e emocional, somente consegui voltar ao Brasil pela misericórdia de outro pastor que usou de seus próprios recursos para financiar minha passagem. Retornei sozinha ao Brasil, com três malárias, anemia profunda e em crises depressivas. Num período de um ano, tentei suicídio três vezes, a última vez em meu primeiro semestre de volta ao Brasil.

Me divorciei e, depois disso, foi um longo processo entre psicólogos, psiquiatras e outras inúmeras especialidades médicas. Fiz faculdade de Teologia, Mestrado e hoje sou doutoranda em Teologia. Decidi me desligar das instituições religiosas, tanto eclesiásticas quanto missionárias, exatamente porque nelas só encontrei abuso, manipulação e busca por poder. Nesse tempo é que conheci a comunidade LGBTQIA+ e que entendi que havia pessoas assexuais. Aos poucos fui me identificando como assexual e depois disso ainda recebi o diagnóstico tardio de autismo.

Tudo isso me ajudou a compreender as maneiras pelas quais entendia Deus, a pessoa do próprio Jesus como assexual, e minha necessidade de vivenciar a sexualidade a fim de ser aceita socialmente e, principalmente, ser aceita na comunhão da igreja. Assexualidade não é um assunto abordado, em nenhum local que frequentei até hoje, e autismo também não. Por isso, minha caminhada tem sido solitária e, na maior parte das vezes, incompreendida.

Optei por uma pesquisa desafiadora em meu doutorado, em torno da Deusa Asherah e seu culto, tanto na Bíblia quanto na arqueologia, sob uma perspectiva diferenciada metodologicamente. Nesse sentido, tenho me inclinado a constantemente desafiar os padrões nos quais me conformei a vida toda, e tenho dedicado meus dias a um ‘ministério de reparação’, a fim de desfazer os falsos ensinos que espalhei por anos por onde passei.

Hoje me satisfaço em minha incompreensão de Deus, não mais tentando definí-lo, da mesma forma que não tento mais me definir, nem permitindo que as estruturas de pensamento e convenções sociais delimitem minha fé. Sou grata por viver plena sozinha, sem necessidades sexuais, ainda que tenha amigos a quem amo muito.

 

Angela Natel – Curitiba/Brasil.

Vamos caminhar juntos? 

https://apoia.se/angelanatel

 

Instagram:

https://www.instagram.com/angelanatel007/

 

Twitter:

https://twitter.com/AngelaNatel_

 

Website:

https://angelanatel.wordpress.com

 

Meu canal no Youtube:

https://www.youtube.com/channel/UC8OOyoQ5vZO-ip9ipz07UDw?view_as=subscriber

EN ESPAÑOL

Mi nombre es Ángela y tengo 41 años. Soy teóloga, lingüista, docente e investigadora, autista y asexual.

Durante muchos años, gran parte de mi vida, viví bajo el estigma del distanciamiento. Como me gustaba estudiar, desde niña, desvié la atención de la gente hacia mi desempeño escolar, desviando la atención de temas relacionados con la sexualidad y la interacción social.

Hoy, entiendo que la mayor parte de mi comportamiento consistió en repetir patrones considerados "normales", tanto en términos de socialización como de sexualidad. Entonces, comencé a jugar y a los 12 años besé solo en los labios por primera vez, ganando aceptación en la escuela. Al mismo tiempo, en el ámbito religioso fui cada vez más aclamado como ejemplo, ya que no me involucraba de forma romántica ni sexual con nadie. Esto no significa que no me considerara apasionada, ni romántica, y siempre he buscado el compañerismo y la amistad profunda con las personas, independientemente de su identidad sexual.

Así, a los 16 años ya era líder de un grupo de jóvenes y aproveché la oportunidad para hablar sobre el compromiso de los jóvenes de mantenerse sexualmente hasta el matrimonio. Entonces, fui un instrumento de reglas fundamentalistas dentro de la institución religiosa, repitiendo patrones de comportamiento considerados aceptables dentro de estos entornos para encajar socialmente porque, de hecho, no sabía cómo hacerlo.

Con respecto a mi relación con Dios, siempre ha estado marcada por crisis existenciales, oraciones mecanicistas y nuevamente por repeticiones de patrones. El autismo -cuyo diagnóstico recibí recientemente- se demostró por el hecho de que tenía una dificultad extrema para orar mientras hablaba, y cuando lo hacía en público seguía fórmulas que ya había estudiado y encontré que funcionaban. Oré por escrito, repitiendo y actualizando los textos bíblicos a mis experiencias. En cuanto a la sexualidad, no era un problema en mi relación con Dios y afectó la forma en que veía a Dios: un hombre asexual. Así, la sexualidad apenas apareció en mi hermenéutica y cuando apareció, a los efectos del estudio comunitario, fue una repetición de los discursos de quienes eran considerados estándares sexuales para el entorno de la Iglesia.

Hice un seminario teológico, el curso de docencia (formación de profesores) y asistí a la Facultad de Letras Portugués-Inglés. A los 24 años fui a Mozambique como misionera. En total, entre idas y venidas, viví 4 años en Mozambique, donde me encontré en una situación de extrema vulnerabilidad. El enfoque de mi enseñanza, que ahora considero colonizador y opresor, estaba en contra de las "herejías" (falsas enseñanzas) y el sincretismo religioso. En este contexto, en medio de la privación emocional, a los 28 años, conocí a un nigeriano que vivía en el país. Confundiendo el amor romántico con la sexualidad, me casé sin tener idea de lo que implicaba un matrimonio. Todas las instrucciones que recibí al respecto fueron de pastores de la Iglesia, quienes nunca me explicaron realmente cómo debía funcionar todo.

20201118_135106.jpg

En mi luna de miel recuerdo haber estado asustada y haber dicho varios 'no', pero no me escucharon y en menos de 3 minutos estaba acostado con un gran dolor al lado de alguien durmiendo como si nada hubiera pasado. Lloré mucho, pero en ese momento entendí - por la enseñanza de la iglesia - que era mi deber satisfacer a mi esposo, y con cada relación, aunque luego comenzó a mostrar interés en satisfacerme, me sentí culpable, como si estuviera simplemente montar un teatro para cumplir una función social. Además de todo esto, sentí que no podía ser cierto que el sexo, algo tan enfatizado en la sociedad, se redujera a algo que me causaba dolor, vergüenza, culpa, asco y desprecio por mí y por el otro.

Durante el año que estuve casado, sufrí todo tipo de violencia: física, psicológica, patrimonial, emocional. Al comunicar esto a mi pastor en ese momento, cuestionó a mi esposo, quien negó todo, y el pastor me consideró una mentirosa, situación que se mantuvo. Física y emocionalmente enferma, solo pude regresar a Brasil gracias a la misericordia de otro pastor que usó sus propios recursos para financiar mi pasaje. Regresé a Brasil sola, con malaria, anemia profunda y crisis depresivas. En un año, intenté suicidarme tres veces, la última vez en mi primer semestre en Brasil.

Me divorcié, y después de eso, fue un largo proceso entre psicólogos, psiquiatras e innumerables otras especialidades médicas. Asistí a la universidad de teología, a una maestría y hoy soy una estudiante de doctorado en teología. Decidí desconectarme de las instituciones religiosas, tanto eclesiásticas como misioneras, precisamente porque en ellas solo encontraba el abuso, la manipulación y la búsqueda del poder. Durante ese tiempo, conocí a la comunidad LGBTQIA + y entendí que había personas asexuales. Poco a poco me fui identificando como asexual y después de eso todavía recibí el diagnóstico tardío de autismo.

Todo esto me ayudó a comprender las formas en que entendía a Dios, la persona del mismo Jesús como asexual, y mi necesidad de experimentar la sexualidad para ser aceptada socialmente y, sobre todo, ser aceptada en la comunión de la Iglesia. La asexualidad no es un tema abordado, en ningún lugar al que haya asistido hasta el día de hoy, y tampoco lo es el autismo. Por lo tanto, mi caminar ha sido solitaria y, en su mayor parte, incomprendido.

Opté por una investigación desafiante en mi doctorado, en torno a la Diosa Asera y su culto, tanto en la Biblia como en la arqueología, desde una perspectiva metodológicamente diferente. En ese sentido, me he inclinado a desafiar constantemente los estándares a los que me he conformado toda mi vida, y he dedicado mis días a un 'ministerio de reparación', con el fin de deshacer las falsas enseñanzas que me he difundido a lo largo de los años.

Hoy estoy satisfecha con mi incomprensión de Dios, ya no intento definirlo, de la misma manera que ya no intento definirme a mí misma, ni permitir que estructuras de pensamiento y convenciones sociales delimiten mi fe. Estoy agradecida de vivir completamente sola, sin necesidades sexuales, aunque tengo amigos y amigas a los que quiero mucho.

 

Vamos caminhar juntos? 

https://apoia.se/angelanatel

 

Instagram:

https://www.instagram.com/angelanatel007/

 

Twitter:

https://twitter.com/AngelaNatel_

 

Website:

https://angelanatel.wordpress.com

 

Meu canal no Youtube:

https://www.youtube.com/channel/UC8OOyoQ5vZO-ip9ipz07UDw?view_as=subscriber

 

Claudia Florentin